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Eu gosto de acreditar que “o pensamento é um pedacinho de futuro, que permanece no campo do sentimento até o momento em que se materializa”. Eu gosto de pensar, porque, assim sendo a vida, provida da qualidade de transformar o verbo em tudo, tudo vira possibilidade a partir de um pensamento, já que tudo se inicia a partir dele e tudo se realiza a partir de um sim. Os cientistas quânticos descobriram, agora de fato, que cada ser deste vasto universo possui o predicado de construir o seu mundo, com as nuances próprias de cada um e suas preferências. É portanto que desejo a sabedoria dos filósofos, mas, ainda mais, a realização dos meus pensamentos.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

A MORTE



O DIA EM QUE EU MORRI
(Texto de Lígia Guerra)

Vou contar como tudo aconteceu.

A minha primeira parcela de morte aconteceu quando acreditei que existiam vidas mais importantes e preciosas do que a minha. O mais estranho é que eu chamava isso de humildade. Nunca pensei na possibilidade do auto abandono.

Morri mais um pouquinho no dia em que acreditei em vida ideal, estável, segura e confortável.

Passei a não saber lidar com as mudanças.
Elas me aterrorizavam.

Depois vieram outras mortes.

Recordo-me que comecei a perder gotículas de vida diária, desde que passei a consultar os meus medos ao invés do meu coração. Daí em diante comecei a agonizar mais rápido e a ser possuída por uma sucessão de pequenas mortes.

Morri no dia em que meus lábios disseram, não.
Enquanto o meu coração gritava, sim!

Morri no dia em que abandonei um projeto pela metade por pura falta de disciplina.

Morri no dia em que me entreguei à preguiça.
No dia em que decidir ser ignorante, bulímica, cruel, egoísta e desumana comigo mesma.

Você pensa que não decide essas coisas?
Lamento. Decide sim!

Sempre que você troca uma vida saudável por vícios, gulodice, sedentarismo, drogas e alienação intelectual, emocional, espiritual, cultural ou financeira, você está fazendo uma escolha entre viver e morrer.

Morri no dia em que decidi ficar em um relacionamento ruim, apenas para não ficar só.
Mais tarde percebi que troquei afeto por comodismo e amor por amargura.

Morri outra vez, no dia em que abri mão dos meus sonhos por um suposto amor.
Confundi relacionamento com posse e ciúme com zelo.

Morri no dia em que acreditei na crítica de pessoas cruéis.
A pior delas? Eu mesma.

Morri no dia em que me tornei escrava das minhas indecisões.
No dia em que prestei mais atenção às minhas rugas do que aos meus sorrisos.

Morri no dia que invejei , fofoquei e difamei.
Sequer percebi o quanto havia me tornado uma vampira da felicidade alheia.

Morri no dia que acreditei que preço era mais importante do que valor.
Morri no dia em que me tornei competitiva e fiquei cega para a beleza da singularidade humana.

Morri no dia em que troquei o hoje pelo amanhã.

Quer saber o mais estranho? O amanhã não chegou.
Ficou vazio… Sem história, música ou cor.

Não morri de causas naturais.
Fui assassinada todos os dias.

As razões desses abandonos foram uma sucessão de desculpas e equívocos.
Mas ainda assim foram decisões.

O mais irônico de tudo isso?

As pessoas que vivem bem não tem medo da morte real.
As que vivem mal é que padecem desse sofrimento, embora já estejam mortas.

É dessas que me despeço.

Assinado:

A CORAGEM

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O instinto de preservação da vida às vezes aparece do nada, com uma força incrível, como o air-bag que dispara antes que a onda de impacto chegue ao ocupante de um carro. Tem gatilho automático e movimento potente.

O texto acima fala da morte sorrateira, aquela que não é percebida pelo dispositivo que foi preparado para acionar a bolsa protetora em caso de forte impacto. É a morte perigosa como veneno de efeito lento. Para esse tipo de morte não há dispositivo de alarde ou alarme, é preciso vigiar e orar. Cuidar para não ser pego de surpresa quando já não há mais coração ou pulmões.

A Bíblia fala da morte como coisa boa. Em Eclesiastes,  "melhor é ir à casa onde há luto do que ir a casa onde há banquete"; em Filipenses, "morrer é lucro"; Jesus diz que "não há amor maior do que daquele que dá sua vida pelo amigo", e acrescenta "devo morrer para mim e nascer um homem novo". 

Mas, que Jesus seja bem compreendido, morte boa é aquela que produz vida, é a morte da semente, como Ele mesmo disse, "se o grão de trigo caindo na terra não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá fruto", e Paulo completa: "insensato! o que tu semeias não é vivificado, se primeiro não morrer".

Ficou parecendo um paradoxo, um texto falando em se preservar e a Bíblia recomendando a morte. É que são momentos e ocasiões diferentes, ambos estão corretíssimos. O primeiro diz da semente que morre antes da maturação, quando a semente ainda não está preparada para frutos, da morte interna, daquela que torna a semente estéril. É preciso compreender que para amar é necessário antes amar a si mesmo.

Nunes


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